quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Breves momentos

Tudo se materializa
Num momento,
Um momento calvo e líquido
Delineado pelo vazio e o nada das coisas,
Vivo disto
Breves momentos
Que um dia morrerão no meu peito
Respirarei no vazio que eles guardam
Será um inspirar breve e agudo
Como todo o infinito

Todo paira num leve silêncio
Numa imaginação
Que fermenta na doce morte
De um adormecer,
Tudo se diluí
No sorriso eterno do mar
Tudo não passa de uma breve
Brisa
De um leve fim
Que o silêncio conta

Ele (mar) está longe
É distante de tudo o que existe
De tudo o que sonhara
Está dentro de todas as coisas
Como se também ele não
Existisse…
  
Dorme dentro de mim
 Nos dias de temporal,
Com o frio de um deus ausente
Um deus doente e perdido
Nos confins de um sonho
Por vezes acalma-se
Parece não existir
Fica sozinho sempre afastado das coisas
Mesmo dentro delas
Tocam-me com medo
E por fim desaparece no céu
Como uma estrela do vazio

Ele adormecia dentro de todas as coisas
Elas pareciam líquidas e pensantes
Como ele
Com seus tons de esmeralda
E cinzas perfumadas pelo abismo

Sepultava nele os meus sonhos perdidos
Ele feliz desaparecia
Enquanto os sonhos baloiçavam
de olhar roliço preso na maresia
Na água que os prendia
Nas suas vagas de silêncios
Que escutava no horizonte

Contava histórias ao mar,
Histórias que nunca chegaram a existir
E que eu imaginava no meu íntimo
Sem chegar a pensar nelas

...Sem chegar a ouvir a língua vazia de um pensamento…

Murmurava curtos vazios,
Curtos silêncios
Silêncios agudos e graves,
Silêncios solitários e apaixonados
Ou simplesmente silêncios silenciosos
Que o vento escutava
Compenetrado neste adeus
Mútuo entre ele e o nada

Afinava-os
Nas figuras esguias do incenso
No curto olhar das nuvens
A bruma emergia na névoa
Cada vez mais líquida e distante,
Cada vez mais viva e azul

Pintada pelos sonhos
Dos poetas
Que nunca chegaram a existir
…Vagueiam…
tacteiam as ondas
De uma melancolia célere e sonâmbula
um breve abraço entre deuses
um beijo infinito que coube
neste breve momento 
nas palavras sussurrantes de uma sombra

Poetas que são mares,
Meninos que se soltam
Ao vento
Na primeira vaga
E adormecem na paz de ser livre

Poetas que são nuvens,
Meninos que sobem montanhas rubras
Sempre com o seu olhar pequenino e distante
E tocam o silêncio fino da névoa

São aqueles que por breves momentos
se esquecem de existir ...
aqueles que em silêncio
dizem todas as palavras
que ficaram por dizer ...

PoReScRiTo


segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

Este vago sabor a abismo

Estou abraçado ao abismo
ele é velho
como os bancos negros
do jardim
que cintilam como estrelas
de um escuro
no ar frio da manhã

O abismo,
trazia um olhar vazio
um aroma neutro
a céu escondido
um leve perfume
ao simples sabor do nada
que lhe adormece
no rosto doce
pintado a fumo e velhice

Está velho,
este deus dos silêncios e dos nadas
de olhar cru
mas de uma invulgar
profundidade
e pensares metafísicos
tapada pelas cinzas
que a brisa traz

É doce a sua velhice
do sabor discreto do fumo
oculto no céu
-continua infinito-
mesmo depois de se
lhe adivinhar o fim...

O seu sorriso marfim
imitando as nuvens
que desenha em pensamento,
o bulício e a melancolia
as tonalidades que cada vez mais
se confundem em si
parecendo ele ser apenas
uma palavra (abismo)

Eu abraço-o
deixando sempre o seu
nome
por dizer,
como se qualquer um
o adivinha-se
olhando as vagas e fagulhas
dos seus olhos restolhados
que se afundam
no leve som das ondas
da maresia
fina e eterna,
que cada vez mais me sabe
a abismo...

Este vento velho
este abraço antigo de um avô
cada vez mais louco e feliz,
abraço-o
pois sei que ele é irreal
porque na verdade
não existe nada realmente feliz,
só este sabor vago a abismo
que se esconde na neblina da serra
na névoa dos pinheiros
com toda a sua sombra
escondida no linho moreno
do seu casaco de pensamentos...

A areia do mar
um cemitério para os sonhos,
despida pela água
esotérica do seu ventre,
agora guarda
no fervor quente das suas ondas,
dentro do sal
que guarda as mágoas de um povo
este meu vago sabor a abismo...


PoReScRiTo