quarta-feira, 25 de junho de 2014

Caminho do céu


Uma nuvem passava
Era rubra e esmeralda
Terra e sangue
Plantada lá no alto
Na areia azul do céu

Acordava descalço
Com o meu olhar de mar,
Por entre búzios prateados
E sibilares de céu…

Regava com os meus olhos,
O azul distante e empalidecido
O meu sonho esgueirava-se nas
Ondas plácidas do destino
Soprando um arco de sombras esguias,
Que pairavam no céu

Da névoa brotavam
Pensamentos melancólicos da existência ,
Arqueava as lágrimas
No seu mais supérfluo sentido

Toquei-lhes com dedos leves
De nuvem
Nada lá existia
Naquela sombra lacrimosa,
Que era o prateado dos peixes
Que brilhava em mim…

O horizonte era uma gota
Atroz de deserto,
Era a névoa fina das minhas lágrimas

Ouvia o arrolhar das ondas,
O marulhar da terra
Que se enegrecia à minha figura

Toquei-me uma última vez,
Era a nuvem que sonhara
Na noite passada…

As minhas lágrimas secavam
Ao vento lunar que se abria,
Lágrimas de céu
Pendiam dos meus tetos
  
 Um dia acordei
Como se não existisse
A nuvem já lá não estava
Naquelas léguas de criança
Apenas o que os meus olhos nunca
Viram…

O dia passara quente
Nas areias do meu céu
Olhava aquele vazio imenso
Lá habitava a paz…
No incenso dos meus dedos

No fim não morri
Porque do céu se tratava,
Adormeci num beijo das
Estrelas,
Que embalavam o meu sonho de menino.

PoReScRiTo



sábado, 14 de junho de 2014

Senhor do Tejo


Levantava-se o temerário
Pelas sombras frias do crepúsculo
Os seus dedos finos
Crepitam cristalinos na bruma seca

Ali caminhava
Confundindo-se na penumbra
Palavras suavam cansadas
Na luz cálida dos seus olhos

O céu estava nu
E apenas as suas duas lentes
Denunciavam a sua presença,
Os seus olhos brilhavam côncavos
Turvos com o passar do vento

A brisa negra passava submissa
Nas suas velas arqueadas,
A lua brilhava para si
Só para ver o seu primeiro dia
De reinado…

Estava ali entre nuvens
A carne dispersa do maior génio
Do universo,
Ele balançava no desassossego dos anjos
Que esvoaçavam nas suas
Garras de Olímpo

Fitava-o cego
Com a sua coroa negra
Ele adormecia no céu de Lisboa
Nesta noite alquímica

A lua pairava no seu vermelho maçónico
Caminhava ao vento
Nos seus passos de miragem
As ruas emanam as papoilas cândidas
Da sua aparição

O manjerico secava nas ruas
Toda a matéria estava junta
Naquele andar doente,
As folhas esfolavam-se nas tijolas de barro
Sucumbindo ao seu passar

Estou ali num dos seus silêncios urbanísticos,
Uma árvore descansa cinzenta
Na sua presença,
Ele sobe os seus ramos e toca o incenso
Das suas folhas,
Arranhas o céu com o teu tocar incolor
Pairas no azul e desapareces numa lágrima
Inexistente…

Afundas-te no mogno espesso

do seu aroma citrino,
Os seixos brilhavam na praia
eram eles as teias do infinito
que germinavam do céu...
Tocas o vazio seco desse espaço
morto,
e perdes-te suavemente de ti...

Estavas ali fitando o rio
Com o teu caderno de silêncios
Ainda te materializavas
No teu sorriso pequeno
Que outrora fora Tejo

O rio estava tenro
No seu estar de carneiro
Agora estava solitário,
Era o emaranhar de lágrimas fraternas
De penas claras da paz fria da morte…

...Nada nascera
Nada morrera
Apenas as sombras cresciam
Em fumos de omnipresença
Num rosto como qualquer outro…

Olhavas as gotas do canal
Com o seu doce abstrato
De inverosimilhança ao mar,
Tinhas olhos claros
De uma lua que se enchia do teu silêncio
Acariciavas as páginas secas
Tingidas de névoa noturna

Desaparecias no teu adormecer
Rompendo as linhas da realidade
Transformas-me num dos teus sonhos
Prematuros,
Estás ali envolvido na secura de um nascer,
Envolto na palidez das nuvens…

Ontem olhava o rio brando
Ele tocava-me com as suas vértebras nuas
Que desmaiavam
No ondular dos meus olhos,
Olho agora o Rei de Lisboa
Ele marulha no céu
Com a sua coroa negra,
Toca com os seus dedos de nuvem
A pele húmida da terra…

Deixavas-te perder
Naquele ondular profícuo
Dos teus olhos…

Outrora homem,
Ontem Tejo,
Hoje céu,
O espelho do universo

Nunca mais morrias
Em tantos anos passados
Estavas só na tua iluminação,
Ainda caminhas nos teus trilhos urbanos
Agora és a estrela
Que habita o meu sorriso rural…

Por entre um olhar acabado
Penduras as vestes na ombreira do céu
Agora a noite brilha
 Em gotas brancas e firmes da minha solidão

Estou só e pequeno
Aqui, no calor da terra
O alecrim recorda-te
E desaparece como a minha
Memória…


Para aquele que foi homem
E agora é as portas do céu
Que se abrem na sua mestria…

XIII/VI/MMXIV
Sexta-feira 

PoReScRiTo 

sábado, 7 de junho de 2014

Menina da Serra


O céu ao longe desaparecia
Apagava-se á figura da serra
Eu caminhava pelas pedras
Gélidas do anoitecer,
Atravessava-o suavemente na sua indiferença

…Atravessava-me…

Uma árvore brilhava ao relento,
Era ela o cristal da manhã
Que escurecia nos meus olhos,
Ela atravessava-me
Com os seus ramos sonâmbulos

Uma voz mineral
Marulhava naquele vazio,
Os seus ramos tocavam o céu
No seu arranhar doce

Estava eu a olhar
Na imensidão,
Escondido nas penas brancas da lua,
Ela adormecia-me no seu embalar eterno

Eu sonhava com o Alentejo,
As suas planícies amarelas
E rostos tórridos,
Via as suas espigas brotarem
Dos meus dias de silêncio,
Estava assim suspenso
Num luto eterno que jaz no céu
(Lua),
Ela que me embalava nas suas pétalas de brancura

São poucas as cores
Que cintilam no vento caloroso
Da minha pele,
O mar chama-lhe de horizonte
Invoca-me na minha partida,

Despeço-me por fim da serra
Que arde cristalina no céu,
No negro do universo,
Ela brilhava ingénua como
Uma criança,
Em enquanto eu me marginalizava
nas origens térreas do meu olhar

Por fim caí num abismo de brumas
Que se desfolhavam com o meu passar,
Um último sibilar da planície
Guiou-me ao esquecimento,
Um silêncio fino roçara
A rosa do céu,
Que adormecia em lágrimas
De beleza,
Com que lampejava o céu

Só paz lhe tomava os seus cabelos d`oiro
Que se transformavam em fios
Brancos de lua
Que anunciavam a despedida…
A noite desaparecia no seu rosto
De criança,
Que acordava todas as manhãs no caos do tempo
E em silêncios de tristeza ...

Dei-lhe um beijo
na sua face insípida,
ela tocara apenas a brisa
que era o meu rosto,
e juntos sonhamos um beijo
nas nuvens pálidas do céu...



PoReScRiTo 


terça-feira, 3 de junho de 2014

olhar alquímico

testemunhas intervenientes
desta união de elementos
Masculino et Feminino
eis Marte e Vénus
eis o Sol e a Lua
que se contemplam
seus olhares transmutam-se
fundem-se na compreensão
Nigredo, Albedo
Citrinitas e Rubedo
o processo alquímico culmina
com a ardente matéria filosofal
;
o imberbere

mar nosso

um

ó mar irado
que te espumas de fúria
golpeando cascos
contra rochedos
o sal que me seca os lábios
é a essência dos descobrimentos

dois

mar denso, mar revolto
reflectido no olhar do marinheiro
luta, segurando o leme com firmeza
digladeia-se revoltado com o revolto
pragueja com gritos enfurecidos
que dão voltas ao navio
o mar açoita o convés
limpa-o de homens
caem ao mar, são engolidos
o marinheiro cerra os dentes
sem lágrimas para derramar
;
o imberbere